segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Nota de esclarecimento da Semas-PE - Legalidade da desapropriação de áreas verdes



O Movimento em Defesa da Mata do Engenho Uchôa reproduz abaixo uma nota oficial da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco (Semas-PE), assinado pela secretária Inamara Mélo e divulgada no último sábado, 12 de novembro. O documento reafirma a legalidade da desapropriação da Mata do Engenho Uchôa, e contesta algumas informações divulgadas erroneamente pelo Sindicato dos Trabalhadores Públicos da Agricultura e Meio Ambiente do Estado de Pernambuco (Sintape).

Seguiremos em nossa luta para que a CPRH aprove o uso dos recursos já existentes, e que enfim, seja criado o Parque Natural Rousinete Falcão.

 

NOTA DE ESCLARECIMENTO (SEMAS-PE)

 

REPRESENTANTES DO SINDICATO USAM ALEGAÇÕES INVERÍDICAS PARA JUSTIFICAR UM POSICIONAMENTO CONTRÁRIO À AQUISIÇÃO DE ÁREAS VERDES.

 

Existirem opiniões distintas sobre um mesmo tema faz parte de um debate democrático e participativo, mas para que haja o devido respeito às opiniões divergentes não se pode lançar mão de argumentos que faltem à verdade na tentativa de justificar seu próprio posicionamento, servindo para confundir a opinião pública e lançar dúvidas sobre a legalidade de um processo amparado confortavelmente em todas as legislações vigentes e legitimado pela mobilização e interesse da sociedade. Assim, no que se refere à proposta de aplicação de recursos de compensação ambiental para a aquisição da Mata do Engenho Uchôa, área de relevante biodiversidade e interesse de preservação e/ou conservação, cabe-me enquanto representante da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco, esclarecer:

 

1 - “Os recursos da compensação ambiental não podem ser usados para aquisição de áreas de categorizadas como Refúgio da Vida Silvestre tendo em vista a limitação imposta pelo artigo 52 da Lei 13.787/2009 ao uso de recursos para áreas que não sejam de posse e domínio do poder público”. INFORMAÇÃO FALSA

 

A utilização dos recursos da compensação ambiental para o estabelecimento de áreas de preservação ambiental está expressamente indicada na legislação nacional e estadual. O artigo 51 da Lei Estadual 13.787/2009 elenca a regularização fundiária como primeira ação para a aplicação dos recursos. Tal entendimento é reforçado pelo Decreto Federal nº 4.340/2002, que regulamenta artigos da Lei nº 9.985/2000, trazendo como primeira ordem de prioridade a aplicação dos recursos da compensação ambiental para a regularização fundiária, aqui transcrito:

 

“Art. 33. A aplicação dos recursos da compensação ambiental de que trata o art. 36 da Lei no 9.985, de 2000, nas unidades de conservação, existentes ou a serem criadas, deve obedecer à seguinte ordem de prioridade: I - regularização fundiária e demarcação das terras”

 

A legislação veda a utilização de recursos de compensação ambiental para a aquisição de bens e equipamentos permanentes em áreas que não sejam de posse e domínio do poder público, o que não se aplica para o caso de vir a torná-las um bem público. Ora, de que outra maneira o poder público poderia promover a regularização fundiária ou o estabelecimento de novas áreas de preservação ambiental, conforme dita o SEUC e o SNUC, se não fosse com a aplicação dos recursos na desapropriação e compra das áreas privadas? Aliás, tal entendimento é amparado em parecer da Procuradoria Geral do Estado, conforme o Encaminhamento GAB nº 23/2022, emitido no bojo do processo SEI nº 3600007966.000019/ 2022-49, em que resta permitida a utilização de recursos de compensação ambiental para estabelecimento de novas áreas de preservação ambiental, o que pode incluir aquisição de bens, regularização fundiária, demarcação de terras, dentre outras medidas.

 

2“Os recursos da compensação ambiental são aplicados conforme plano operacional aprovado pela Câmara Técnica de Compensação Ambiental, que é formada exclusivamente por dirigentes daquela instituição”. (O que impediria a escuta de outros atores e a recomendação que a SEMAS submeteu ao Consema). INFORMAÇÃO IMPRECISA

 

Diz a Lei Estadual nº 13.787/2009 em seu Art. 48: “A Câmara Técnica de Compensação Ambiental, instituída no âmbito do órgão ambiental licenciador, em conjunto com o órgão gestor do SEUC, com a finalidade de analisar e definir a aplicação dos recursos da compensação ambiental em unidades de conservação deverá ouvir o CONSEMA, os conselhos gestores e os órgãos gestores das unidades de conservação afetadas e indicadas para serem beneficiadas pelos recursos.”

 

3 – “Não se pode alterar um Termo de Compromisso, cabendo a execução do objeto já firmado com o empreendedor”. INFORMAÇÃO FALSA

 

Conforme explicita o citado parecer da PGE, a despeito do silêncio das normas aplicáveis ao Estado de Pernambuco quanto à alteração de termos de compromisso de compensação ambiental, há que levar em conta, por analogia, a Normativa ICMBIO nº 10/2014, que regula o tema no âmbito do Instituto Chico Mendes, que prevê que “durante a vigência do TCCA, as ações destinadas às unidades de conservação federais, previstas no art. 33 do Decreto 4.340/2002, poderão sofrer alterações, no interesse do Órgão Gestor, desde que os processos de aquisições não tenham sido iniciados pelo empreendedor, no caso de execução direta”, podendo “ser ajustado, no interesse da Administração”, por apostila ou aditivo, este último “quando se tratar de alteração de valores, alteração ou inclusão de unidade de conservação beneficiada ou alteração das ações destinadas pelo Órgão competente, em decorrência de redestinação de recursos de compensação ambiental”. Deve-se considerar também as disposições das Leis 8.666/93 e 14.133/2021 quanto às modificações unilaterais ou por acordo entre as partes autorizadas em contratos administrativos.

 

Desta maneira, entende-se juridicamente possível a modificação de termos de compromisso de compensação ambiental, para “alteração ou inclusão de unidade de conservação beneficiada ou alteração das ações destinadas pelo Órgão competente”, observadas as seguintes condicionantes: i) Interesse da Administração; ii) Justificativa técnica; iii) Obediência às prioridades previstas na legislação; iv) prévia oitiva do CONSEMA, dos conselhos gestores e dos órgãos gestores das unidades de conservação envolvidas; v) prévia manifestação do empreendedor signatário do termo de compromisso; vi) aprovação da Câmara Técnica de Compensação Ambiental.

 

Importante destacar que todos os referidos condicionantes foram cuidadosamente seguidos, inclusive obtendo a expressa concordância do empreendedor, faltando tão somente a aprovação da Câmara Técnica de Compensação Ambiental. Esta tem autonomia para a sua decisão, devendo, assim, agir para que os recursos sejam efetivamente aplicados garantindo a sua finalidade.

 

Ainda no que se refere ao cumprimento dos aspectos legais, faz-se necessário esclarecer que:

 

I - Esta Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade realizou a contratação de empresa especializada em consultoria nas áreas da engenharia agronômica, ambiental e arquitetura para elaboração de laudo de avaliação e valoração de terras localizadas na Mata do Engenho Uchoa a pedido da própria Agência Estadual de Meio Ambiente - CPRH, por intermédio do Ofício DPR n° 396/2020, o que foi efetivado por meio do Processo Licitatório nº 0024.2021.CPL.PE.0014. SEMAS - Pregão Eletrônico nº 0014.SEMAS;

 

II - A Semas submeteu a recomendação ao Conselho Estadual de Meio Ambiente considerando a disponibilidade de recursos de compensação ambiental oriundos de Termos de Compromisso firmados há praticamente dez anos, e sob o entendimento de que os objetos desses termos foram definidos pela CPRH, cabendo a ela a decisão ou não de alterar, além do entendimento de que grande parte das atividades voltadas à realização de estudos ambientais e planos de manejo das Unidades de Conservação estaduais previstas nos Termos de Compromisso estão sendo desenvolvidas no âmbito do Programa UC Pernambuco, por iniciativa da Semas, e para o qual já existem recursos garantidos da compensação ambiental.

 

III - Considerando os entraves burocráticos e técnicos enfrentados internamente pela CPRH na implementação de uma política que permita otimizar o potencial das áreas para a conservação e o uso público, resolver questões fundiárias e destravar a implementação das UCs de forma a conciliar a proteção da biodiversidade com o desenvolvimento sustentável, a SEMAS atuou dentro do que lhe confere a Lei Nº 16.520, de 27 de Dezembro de 2018, que estabelece, entre as suas prerrogativas, a de a delegar e avocar atribuições e competências para suas autarquias, fundações e parceiros públicos; bem como aplicar recursos provenientes da compensação ambiental. Desta feita, sem exorbitar um milímetro de suas competências legais, tem contratado serviços de consultoria para avançar na gestão das unidades de conservação com a realização de planos de manejo, estudos ambientais e de valoração das propriedades colocando tais estudos à disposição da CPRH e de seus técnicos, sob a édige da Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco (PGE/PE) e do mais defensável interesse ambiental e coletivo.

 

Ademais os aspectos legais, a compra, desapropriação e ações de regularização fundiária de áreas naturais para a implantação de Unidades de Conservação contribuem efetivamente para o avanço no cumprimento de metas locais, nacionais e internacionais de conservação e por vezes implicam em condição sine qua non para a sua implementação.

 

O montante a ser destinado à aquisição da Mata Uchoa não é o que impede necessariamente o atendimento a outras unidades de conservação estaduais para a sua estruturação. Os cerca de 90 milhões que restariam em caixa já seriam um importante impulso para apoiar a implementação das UCs desde que houvesse projetos estruturadores, no que a SEMAS tem insistido em ajudar, submetendo reiteradamente propostas para o crivo da CPRH. Também não se pode confundir a compra de um bem com gasto ou custeio, tendo em vista que o recurso se transforma em patrimônio e bem público, com a perpetuação do valor investido.

 

A SEMAS levantou demandas de regularização fundiária/desapropriação de propriedades, no todo ou em parte, das seguintes áreas para efetivar e ou ampliar Unidades de Conservação: Reserva de Vida Silvestre Mata Engenho Uchoa – Recife; Estação Ecológica Bita e Utinga –Cabo de Santo Agostinho e Ipojuca; Eco Fazenda Morim – São José da Coroa Grande (RPPN); Refúgio da Vida Silvestre Matas de Gurjaú (Cabo, Jaboatão e Moreno); Refúgio da Vida Silvestre Matas de Água Azul (Timbaúba, Vicência e Macaparana); Estação Ecológica Serra da Canoa (Floresta) e Santuário Três Reinos (Recife), todas elas com suas especificidades, mas com inconteste valor ambiental, e cujas demandas carecem, todas elas, de serem atendidas pelo poder público, devendo fazê-lo obedecendo à maturidade dos respectivos processos legais e técnicos.

 

Por fim, sustento que a Mata do Engenho Uchoa é uma porção representativa da Mata Atlântica, inclusive de seus ecossistemas associados, a exemplo dos Manguezais, o que a levou à condição de Unidade de Conservação municipal e estadual e objeto de luta preservacionista numa região que abrange 11 bairros e 270 mil moradores. Há 43 anos o Movimento em Defesa da Mata do Engenho Uchoa tem apresentado razões para a aquisição da área com vistas à implantação de um parque de uso público, resistindo às constantes tentativas de invasão ou de destinação para outros usos e que colocam a preservação da área sob forte risco. De outro lado, a incompatibilidade de uso da área pelos proprietários gerou uma disputa judicial que pode impor o pagamento de indenização 4X maior que o estabelecido pelo presente laudo de valoração ambiental da área sobre um direito não reconhecido pelo Poder Público.

 

Não seria demais chamar a atenção de pretensos ambientalistas que, ao questionarem a proposta de aquisição da Mata Uchoa com os recursos existentes para esta finalidade, estarão retardando ou impedindo definitivamente o atendimento a uma causa necessária e justa, uma vez que resta incerta a implementação da UC diante da incompatibilidade de uso, tal como se apresenta. Nos manifestamos assim, ao participarmos da COP27, no Egito, com absoluta consciência de que Pernambuco tem buscado implementar uma política ambiental consistente e estruturadora, e que esta proposta do governo do Estado é a mais acertada por defender um patrimônio para as futuras gerações e por se colocar ao lado do legítimo e incansável Movimento em Defesa da Mata do Engenho Uchoa.

 

Sharm el-Sheikh/Egito, 12 de novembro de 2022.

 

Inamara Mélo

Secretária Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade - SEMAS


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