Petrobras erra ao abandonar os biocombustíveis, dizem engenheiros
O Plano Estratégico da Petrobras (PE 2017-21) prevê a saída integral da produção de biocombustíveis. [1] A decisão de desistir da produção de biodiesel e de etanol é um erro que compromete a sustentação empresarial e os compromissos ambientais brasileiros apresentados a COP-21, em Paris. [5]
Por Felipe Coutinho* e Enrique Ortega**
Na contramão dessas tendências, a Petrobras regride ao sair da produção do biodiesel e ao vender participações em etanol. O preço deste erro será alto e recairá sobre a estatal e a sociedade brasileira, mais cedo do que se imagina.
A Petrobras Biocombustível (PBio) é a subsidiária integral que atua na produção de biodiesel e tem parcerias na produção de etanol. A estatal iniciou a produção de biodiesel em 2008 e disputa a liderança do setor com sua produção em unidades próprias e em parceria. Além da relevante participação industrial, a Petrobras desenvolveu tecnologia própria e aplicou inovações para aumento da produção e na redução dos custos industriais. O biodiesel já representa 7% do diesel vendido no Brasil que é o segundo maior produtor mundial, a mistura será elevada para 10% até 2019.
A revista Biodiesel BR destaca que “A indústria brasileira de biodiesel está se preparando para entrar num novo ciclo de expansão acelerada que, se tudo correr como deve, levará o setor a um nível inteiramente novo de atividade. De volumes pouco inferiores a 325 milhões de litros – média mensal desde a oficialização do B7 –, as usinas precisarão fabricar mais de 510 milhões de litros ao mês a partir da chegada do B10 em março de 2019”. [2]
Os críticos da atuação da Petrobras no setor apontam os resultados empresariais e prejuízos anuais da PBio. Além de inferir que a Petrobras teria uma espécie de defeito genético que a impediria de atuar eficientemente na produção de biocombustíveis, pela importância da etapa agrícola na cadeia de valor. Quando os críticos assumem a gestão da estatal a profecia se auto realiza.
Os fracos resultados empresariais são consequência da desintegração da PBio na produção de biodiesel e da conjuntura setorial do etanol. A estatal compra as matérias primas para produção do biodiesel (óleos vegetais e gordura animal) dos seus competidores, ou potenciais competidores, que conhecem os custos da cadeia de valor e asseguram suas margens, em detrimento da Petrobras.
É preciso fortalecer a Petrobras Biocombustível reavaliando o seu modelo de negócios para que tenha acesso as matérias primas com custos mais baixos e próximos aos custos de produção. Desenvolver produtores e a cadeia de valor para atuação integrada, sem depender da aquisição das matérias primas de seus competidores. Precisa ampliar sua área de atuação para a produção de energia elétrica de origem renovável, eólica e solar. Atuar também nas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), opções rentáveis para geração distribuída de energia.
Diferente do biodiesel que é produzido diretamente pela PBio, a estatal tem parcerias em etanol e não atua diretamente na operação e produção industrial. A estratégia prejudica a integração e a retroalimentação do aprendizado operacional, com os ciclos de pesquisa aplicada, inovação e engenharia. Todo o setor amargou prejuízos nos últimos anos e a PBio não foi exceção. Esse artigo não pretende avaliar as condições setoriais, mas as condições específicas da atuação da Petrobras nos biocombustíveis.
Em 2015, a comercialização de gasolina alcançou 41,137 bilhões de litros, enquanto que em 2014, foram vendidos 44,364 bilhões. O resultado representa queda de 7,3%. O etanol total, que é a soma de etanol anidro (etanol misturado à gasolina) e etanol hidratado (etanol combustível), subiu de 24,085 para 28,796 bilhões de litros, indicando alta de 19,6% em 2015, na comparação com 2014.
O etanol tem participação relevante e potencial de crescimento ocupando o mercado da gasolina. A Shell constituiu a Raízen, em sociedade com a Cosan, garantindo propriedade dos meios de produção e o acesso ao mercado brasileiro de etanol. A multinacional anunciou recentemente a oferta para aquisição da unidade para produção do etanol celulósico (2ª geração) da Abengoa, localizada no Kansas (EUA). [3]
O etanol celulósico, produzido a partir do bagaço da cana, aumenta significativamente o potencial da produção de etanol brasileiro. O desenvolvimento tecnológico e as políticas públicas para o setor, se bem-sucedidos, podem alterar o atual paradigma técnico-econômico da indústria aumentando sua competitividade. Segundo estudo do BNDES “...por conta de avanços nas etapas de produção e conversão de biomassa e da redução no custo de enzimas e equipamentos, o E2G pode ser mais competitivo que o etanol convencional e próximo do patamar de preço de barril de petróleo a US$ 44, no longo prazo”. Diz ainda que “Com esse nível de competitividade, o E2G não seria apenas uma solução para reduzir o volume de gasolina importada pelo Brasil, mas também uma alavanca poderosa de exportações, haja vista o fato de o consumo de combustíveis avançados ser valorizado por políticas públicas nos EUA e na Europa”. [4] A Petrobras tem realizado significativos investimentos na pesquisa desta alternativa tecnológica. O plano de desmobilização da estatal reduz o potencial de sucesso do etanol celulósico brasileiro.
O Brasil é um dos países com maior potencial de expansão da produção de biocombustíveis e energias renováveis por sua extensão agricultável, pelo potencial aumento da produtividade agrícola, além da elevada incidência solar, potencial eólico e disponibilidade de água. Quando a Petrobras decide abandonar os biocombustíveis ela desiste de desenvolver uma das vocações do Brasil, país continental e tropical.
Os modelos produtivos precisam ser melhor concebidos, já que os biocombustíveis produzidos convencional e atualmente são intensivos em recursos de origem fóssil nas etapas agrícolas e industriais. Como resultado, apenas uma fração da produção atual pode ser considerada renovável. [6] A Petrobras deve ser o motor indutor dos novos modelos, das ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. O novo modelo produtivo precisa incorporar sistemas agroflorestais e agrosilvipastoris de cunho ecológico, em escala suficiente, para garantir a sua sustentabilidade.
A janela da viabilidade fóssil parece se fechar quando os custos médios e mundiais de exploração e produção de petróleo se elevam, enquanto a demanda por derivados se deprime com a elevação dos preços. São sinais da urgência da transição energética para alternativas renováveis. [7]
A renda petroleira deve ser usada para levantar a infraestrutura para a produção das energias renováveis que são essenciais para o futuro. A Petrobras é fundamental nesta transição para gerar valor e garantir a segurança energética brasileira.
* Felipe Coutinho é engenheiro Químico, Presidente da Associação de Engenheiros da Petrobrás (AEPET) http://www.aepet.org.br/
** Enrique Ortega é professor, Laboratório de Engenharia Ecológica e Informática Aplicada da UNICAMP
Referências:
[1] http://www.petrobras.com.br/
[2] https://www.biodieselbr.com
[3] http://biomassmagazine.com/
[4] https://web.bndes.gov.br
[5] http://www.itamaraty.gov.br/
[6] http://www.globalbioenergy.org
[7] https://felipecoutinho21.files.wordpress.com/
Fonte: Portal Vermelho A Esquerda Bem Informada
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