domingo, 13 de maio de 2012

MUDANÇAS CLIMÁTICAS: CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS


Introdução
A Conferência da ONU sobre as Mudanças Climáticas (COP 16) realizou-se em Cancun, entre os dias 27 de novembro e 10 de dezembro de 2010. O tema central, objeto de marcadas contradições, se relacionou com a continuidade ou não do Protocolo de Quioto, acordo firmado para combater as mudanças climáticas.
Evidenciando a importância do tema o documento intitulado “Posição da China na Conferência de Copenhague” afirma “A mudança climática é um dos mais sérios desafios da humanidade no século 21 e uma questão que diz respeito à sobrevivência da humanidade”.    
Mudanças Climáticas¹
Na COP 16 houve um ponto de vista convergente, entre os países participantes, sobre as mudanças climáticas e a responsabilidade humana na emissão de gases que fizeram aumentar o efeito estufa.
O efeito estufa é o fenômeno garantidor da existência da vida no planeta Terra, mantendo a temperatura média no nosso planeta em 14 °C. Caso este fenômeno não existisse a Terra seria gelada, com 19°C negativos. Isto porque os gases de efeito estufa retêm parte do calor emitido pelo sol, aquecendo o planeta.
O efeito estufa existe em decorrência de fatores naturais e humanos. Dentre os fatores naturais a atividade solar é a mais importante e principal responsável pelo aquecimento da Terra. Ocorre, com maior ou menor intensidade, em decorrência de vários fatores.
A pesquisa da atividade solar permitiu a formulação dos “Ciclos de Milankovitch”² que identificou a variação da atividade solar ocorrendo a cada 105, 41 e 21 mil anos. E que a quantidade e a distribuição das emissões solares varia com o tempo, com a distância entre o Sol e a Terra e com a inclinação do eixo de rotação do nosso planeta.

fig1figura 1 -: Mudanças da temperatura global anual (linha vermelha suave) com a média de temperatura de 11 anos (linha vermelha forte). Temperatura do NASA GISS. Irradiância Solar Anual Total (linha azul suave) com a média de irradiância de 11 anos. Irradiância Solar Total de 1880 a 1978 de Solanki. Irradiância Solar Total de 1979 a 2009 do PMOD.

A figura 1 indica que a temperatura e a irradiação solar tiveram evoluções diferentes, sobretudo a partir de 1970. Neste ano a atividade solar iniciou uma redução enquanto aumentou, de forma acentuada, a temperatura da Terra.

Segundo Benestad, 2009: “Nossa análise mostra que a contribuição mais provável da forçante solar no aquecimento global é 7 ± 1% para o século XX e desprezível para o aquecimento desde 1980”
As manchas solares também exercem influência sobre o clima da Terra e alteram em semanas ou anos. No início do século XX houve evidencias do crescimento da atividade solar. Todavia o IPCC considera que elas não foram decisivas para as mudanças climáticas que estão ocorrendo.
Também as erupções vulcânicas e a queima de biomassa, exercem influência na redução da temperatura. Em ambos os casos são produzidos aerossóis (partículas de cinza) que refletem a irradiação solar de volta para o espaço, reduzindo a temperatura da Terra.
Estudos realizados sobre o efeito estufa indicam que, desde a Revolução Industrial, a queima de combustíveis fósseis, fruto da ação humana, joga papel importante na ocorrência deste fenômeno, causando o aquecimento do planeta. O combustível utilizado nas primeiras fases do processo de industrialização foi o carvão e posteriormente o petróleo.
O principal gás de efeito estufa é o vapor d´água. Ele retém 2/3 do calor apreendido pelos gases de efeito estufa. Dos gases decorrentes da queima de combustíveis fósseis e da queima de biomassa o mais importante é o dióxido de carbono CO2. É responsável por 80% do efeito estufa decorrente da ação humana. Outros dois importantes gases são o metano e o dióxido nitroso.
Os gases de efeito estufa e as nuvens absorvem e reemitem parte da radiação solar emitida para a superfície do nosso planeta, aumentando o calor. Assim, uma maior quantidade de gases de efeito estufa acarreta maior aquecimento da Terra.

O Aquecimento Global é inequívoco
A figura 2 sintetiza as conclusões do IPCC³ de que houve um aquecimento da Terra de, aproximadamente, 1° C nos últimos 150 anos. Sendo que, entre 1970 e 2004 houve aumento de 70% nas emissões de gases de efeito estufa, assim como um aumento do nível dos oceanos e uma redução da neve do Hemisfério Norte, indicando um inequívoco aquecimento global.
fig2Figura 2
Os dados referentes à concentração passada de CO 2 na atmosfera, foram obtidos a partir de bolhas de ar preservadas no gelo, há milhares de anos. Os cientistas perfuraram três quilômetros da calota de gelo da Antártida e retiraram uma coluna de gelo que abrange um milhão de anos da história da Terra. Também as árvores milenares fornecem elementos para este estudo.
Os dados mais recentes sobre o clima da Terra são obtidos pela Organização Meteorológica Mundial das Nações Unidas. Ela monitora 10 mil estações meteorológicas instaladas na terra e sete mil em navios e satélites. Participam deste programa 185 países. Com estes instrumentos os cientistas dispõem de dados bastante confiáveis sobre a temperatura do nosso planeta.
A comprovação de que certo tipo de CO2 decorre da ação humana está em sua assinatura isotópica. Isto é o CO2 originário de causas naturais tem ligeira preferência pelo isótopo de carbono mais leve (¹²C) em relação ao mais pesado (¹³C). O (¹³C) originário da ação humana, provoca o aquecimento da troposfera e resfriamento da estratosfera. Se a emissão de CO² fosse decorrente, somente, de causas naturais haveria um aquecimento tanto da troposfera como da estratosfera, o que não ocorre.
A figura 3 indica que a maior parte da elevação da temperatura observada na média global desde meados do século 20 é provável (mais de 90%) que seja devido ao aumento dos gases de efeito estufa antropogênicos.
A linha azul indica o crescimento do CO2 natural. Já o total das emissões de CO2 (natural e antrópica), no mesmo período, indica uma elevação bem mais acentuada do que unicamente a emissão natural
fig3Figura 3: CO2 levels (Green Line - Law Dome, East Antarctica and Blue line - Mauna Loa, Hawaii) and Cumulative CO2 emissions in gigatonnes of CO2 (Red Line - CDIAC). 


Todavia há uma corrente minoritária entre os cientistas, intitulada de céticos, que defende o ponto de vista de que os fatores determinantes das mudanças climáticas decorreriam, fundamentalmente, dos processos naturais. No entanto a grande maioria dos cientistas considera que as causas naturais não conseguem explicar o aumento da intensidade dos gases de efeito estufa de 280 para 379 ppmv4 entre 1750 e 2005. Ressaltam, também, que os processos naturais absorvem mais que emitem CO2, funcionando como sorvedouros deste gás.
Os céticos ainda argumentam que o resfriamento ocorrido na década de 40 ,quando houve uma queda de 0,1% na temperatura global, comprovaria que é falsa a idéia de que o clima aumentou nos últimos 150 anos. No entanto estudos comprovaram que este resfriamento decorreu dos aerossóis fruto dos resíduos das chaminés das fábricas, da produção de cimento e da queima de biomassa, produzido pelo desmatamento. Estas partículas fazem com que haja uma refração de parte dos raios solares, esfriando o planeta. No entanto a adoção de filtros nas chaminés das fábricas fez com que o aquecimento retornasse.
O Aquecimento Global está acelerando
A figura 4 abaixo indica uma aceleração do aquecimento da Terra. Entre 1970 e 2004 houve um aumento de 70% nas emissões de gases de efeito estufa. O dióxido de carbono (CO2) aumentou 80 % deste total. O restante foi proveniente da queima de florestas e das mudanças do uso do solo. Com isto houve uma acentuada aceleração da temperatura da Terra a partir de 1970.
fig4
Figura 4
Source: Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) AR4.







Consequências das Mudanças Climáticas
As mudanças climáticas têm consequências diferenciadas em nosso planeta. Produz secas e graves problemas climáticos em sua maior parte, afetando a produção de alimentos e outras graves consequências que atingem os países mais pobres e as camadas mais pobres. Por outro lado, em decorrência do derretimento do gelo no Ártico, permite a exploração agrícola e do petróleo nestas áreas.
A Fundação Ecológica Universal (FEU), organização da Argentina dirigida por Osvaldo Canziani, ganhador do prêmio Nobel de 2007 elaborou o estudo intitulado “ A falta de alimentos – Os impactos das Mudanças Climáticas na Produção de Alimentos: uma Perspectiva para 2020”.
Este estudo concluiu que se o atual ritmo de aquecimento global continuar até 2020 haverá uma queda na produção de alimentos dos 20 maiores produtores de grãos. O país mais afetado será a Índia, com a redução de 30% de sua produção agrícola. A África será o continente que mais sofrerá com secas prolongadas, sendo grande a possibilidade da perda de 75% de suas terras aráveis. Tais fatos evidenciam a gravidade da situação.
O estudo reconhece, também, que algumas regiões serão favorecidas com as mudanças climáticas como o norte dos Estados Unidos, Canadá, regiões mais ao norte da Europa e da Rússia. Todavia o aumento da produção nestes lugares não será suficiente para suprir a queda da produção das demais áreas do globo terrestre.
Pelas conclusões sobre as mudanças climáticas fica evidente a necessidade de adotar medidas que reduzam a emissão dos gases de efeito estufa. Todavia as próprias conclusões do IPCC indicam uma variação bastante grande entre um mínimo de 1,1°C e o máximo de 6,6°CV de aquecimento até 2100. Portanto não cabe o alarmismo de considerar que o mundo está acabando. Cabe destacar que na ciência não há verdades absolutas. Pelo contrário a ciência está em constante processo de avanços. Todavia a existência de sólidos indicadores deve determinar uma atitude de cautela e de adoção de medidas para enfrentar o problema.
Se por um lado não devemos cair no alarmismo, por outro seria irresponsabilidade não adotar medidas preventivas, mesmo não havendo certeza absoluta sobre as dimensões do problema.
Se estes argumentos científicos não fossem suficientes para dirimir as dúvidas, a posição da totalidade dos países que participaram da Conferência de Cancun sobre a necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa indica a importância do problema e traz fortes razões para se ter confiança nos estudos que indicam o aquecimento global.
O argumento de que a adoção de medidas para reduzir a emissão de gases de efeito estufa seria uma imposição dos países desenvolvidos para impedir o desenvolvimento dos países pobres, não se sustenta.
Na realidade, são os países em desenvolvimento que defendem cortes mais radicais das emissões dos gases de efeito estufa. Isto porque sobre eles e as camadas mais pobres que recaem as maiores consequências. Já os países desenvolvidos resistem aos cortes mais radicais porque, como têm de cumprir metas obrigatórias, terão que realizar grandes cortes das emissões de gases de efeito estufa, prejudicando o desenvolvimento.
Prova da posição mais radical dos países em desenvolvimento está no fato de que, em Cancun, para se conseguir aprovar a resolução final o acordo só foi possível em torno do objetivo de assegurar que o aumento do aquecimento fosse menor de 2° C até 2100. Já os países em desenvolvimento defenderam 1,5°C e os países da ALBA 1°C.
A China que tem realizado estudos científicos sobre o tema. O documento intitulado “China Políticas e Ações para combater as alterações climáticas” destaca que “ As mudanças climáticas globais e seus efeitos negativos são uma preocupação comum da humanidade. Desde a revolução industrial, as atividades humanas, especialmente o consumo maciço de energia e de recursos pelos países desenvolvidos no processo de industrialização, têm aumentado as concentrações atmosféricas de gases de efeito estufa, produzido impactos visíveis sobre os ecossistemas naturais da Terra, e graves desafios colocados para a sobrevivência e o desenvolvimento da sociedade humana”
O Protocolo de Quioto foi adotado visando tomar medidas para a redução do efeito estufa. Para isto estabeleceu o princípio das “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”. Os países desenvolvidos, grandes poluidores e responsáveis históricos pelo aquecimento global têm maior responsabilidade na redução das emissões. Em decorrência disto têm metas obrigatórias de redução das emissões de gases de efeito estufa.
Já os países em desenvolvimento ficaram obrigados a estabelecer metas voluntárias. Isto porque não têm responsabilidades históricas pela emissão de gases poluentes e necessitam se desenvolver para resolver os seus graves problemas sociais. O Protocolo de Quioto entrou em vigor em 1955 e hoje tem 192 países como signatários.
Na COP16 manifestou-se de forma acentuada o conflito existente entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento em torno da segunda fase de compromissos do Protocolo de Quioto. O Japão, contando com o apoio do Canadá, Austrália e outros países desenvolvidos, argumentou que só aceitaria se comprometer com uma segunda fase do Tratado se a China e os Estados Unidos assumirem metas obrigatórias como os demais países desenvolvidos. A China, por seu lado, contando com o apoio dos países em desenvolvimento afirmou que não aceitaria a ruptura do Protocolo de Quioto, destacando que não tinha responsabilidades históricas e necessitava se desenvolver para alimentar um bilhão e duzentas mil pessoas.
O pano de fundo desta polêmica se relaciona com o mundo multipolar em gestação. Os Estados Unidos, o Japão e outros países tudo fazem para tentar conter o ritmo de crescimento dos países em desenvolvimento em particular da China. Por isto querem impor metas obrigatórias de redução dos gases de efeito estufa, à China e a outros países em desenvolvimento.

Aldo Arantes
Secretário Nacional de Meio Ambiente do PCdoB e da FMG
Diretor Presidente do Instituto de Pesquisas e Defesa do Meio Ambiente (INMA)
¹As mudanças climáticas podem se referir tanto ao aquecimento como o resfriamento da Terra. Hoje, para a maioria dos cientistas, mudança climática é sinônimo de aquecimento global.
²Milutin Milankovitch foi um astrônomo Sérvio que, no início do século XX , descobriu e quantificou o impacto das mudanças astronômicas na insolação recebida pela Terra.
 ³O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) é um organismo criado pela Assembléia Geral da ONU. Atualmente 194 países são seus membros, além de grande número de cientistas. Ele não faz pesquisas, mas sistematiza as realizadas, elaborando relatórios que são submetidos à apreciação dos países membros.
 4ppmv e ppbv são medidas de concentração de gases e exprimem, respectivamente, partes por milhão e partes por bilhão em volume .


Fontes de Consultas:
1- Conferência Mundial das ONU sobre as Mudanças Climáticas, dezembro de 2010, Cancun, México.
2- China Políticas e Ações para combater as alterações climáticas, 2008.
3- Posição da China na Conferência de Copenhague sobre as Mudanças Climáticas, 2009.
4- Seminário Internacional sobre as Mudanças Climáticas. Brasília, Fundação Maurício Grabois, novembro de 2010.
5- FLANNERY, Tim. Os Senhores do Clima. Rio de Janeiro : Record, 2007.
6-PORTO-GONÇALVES, Carlos Walter, Artigo “Outra Verdade Inconveniente – a nova geografia política da energia numa perspectiva subalterna”.
7-VEIGA, José Eli, (organizador). Aquecimento Global – frias contendas científicas. São Paulo, Editora SENAC, São Paulo, 2008.

Fonte: INMA - Instituto Nacional do Meio Ambiente   

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