domingo, 13 de março de 2011

Quando o lixo vale dinheiro

Rosa Falcão
rosafalcao.pe@dabr.com.br
Edição de domingo, 13 de março de 2011 - DP

Logística reversa é aposta do mercado, que movimenta US$ 20 bilhões por ano no país


Veja como é feita a operação de logística reversa de produtos químicos recolhidos no mercado, pelo Centro de Distribuição (CD) da Talog, em Recife. Imagens: Laís Telles./DP/D.A Press
Qual o destino dos produtos que entram no mercado de consumo quando acaba a vida útil? E das embalagens? E dos insumos e matérias-primas usados no processo industrial? Somente com eletroetrônicos o Brasil gera 2 milhões/ano de toneladas de lixo. No mundo são 40 milhões de toneladas/ano. Fabricantes, lojistas, consumidores, governos. Todos são responsáveis pelo ciclo: produção-circulação-mercado-consumo-lixo. A logística reversa - retirada de produtos do mercado de consumo para reprocessamento e reciclagem - é um caminho sem volta. As empresas do setor movimentaram US$ 750 bilhões nos Estados Unidos e US$ 20 bilhões no país em 2010 com a captação inteligente do lixo.

Desde 2003, a Associação Brasileira de Logística Reversa (Aslog) trabalha com o conceito. Atende a quase 3.300 pontos de coleta de pilhas e baterias pós consumo no país. A expectativa da Aslog é que o setor cresça entre 10% e 12% em 2011. Além do apelo do crescimento sustentável com práticas produtivas em respeito ao meio ambiente, a nova Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) exigirá das empresas a responsabilidade pela retirada dos produtos do mercado pós vida útil.

Seis cadeias de produtos de retorno industrial terão prioridade para se adequar à nova lei: embalagens de agrotóxicos, pneus, pilhas e baterias, óleos e lubrificantes, eletroeletrônicos e lâmpadas fluorescentes. O diretor de Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Sérgio Gonçalves, explica que a nova lei vai cobrar a responsabilidade compartilhada. ´A PNRS instituiu oficialmente no país a logística reversa. Desde o fabricante ao consumidor todos são responsáveis pelo remanejamento adequado e o destino final dos resíduos`.

Estudioso e pesquisador do tema há mais de 25 anos, o professor Paulo Roberto Leite, preside o Conselho de Logística Reversa no Brasil (CLRB). Autor do livro ´Logística Reversa - Meio Ambiente e Competitividade`, ele considera interessante a lei aprovada no Brasil. ´A legislação utiliza a ideia do político pagador e da responsabilidade. Não é só o fabricante, mas quem vende e o consumidor devem ser envolvidos, desde que tenha um sistema de logística reversa ao seu alcance`, indica.

Leite explica que a logística reversa abrange aqueles produtos que retornam do mercado mesmo sem ser consumidos (defeituosos ou que passaram pela assistência técnica) e aqueles que chegaram ao fim da vida útil e precisam ser descartados. Só para citar o exemplo dos eletroeletrônicos e eletrodomésticos - que têm ciclo de vida útil cada vez mais curto - é importante o descarte seguro sem poluir o meio ambiente.

E o melhor é a possibilidade de geração de renda com a reciclagem. Atualmente, entre 5% e 10% dos produtos colocados no mercado de consumo no país são devolvidos pela logística reversa. Em 2010, a pós venda desses itens movimentaram cerca de R$ 16 bilhões.

Como acontece a logística reversa com embalagens de alumínio


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Central em Pernambuco
Edição de domingo, 13 de março de 2011


A Talog, holding da Transportadora Americana (TA), é uma das maiores empresas do setor de logística no mercado nacional. Há onze anos em Pernambuco, a empresa instalou em fevereiro uma nova central de distribuição (CD) próxima ao Aeroporto dos Guararapes. O foco da operação é o transporte de insumos e itens descartados com cobertura na região Nordeste. Atualmente, a empresa faz logística reversa de produtos químicos e de higiene e limpeza. São movimentadas 40 toneladas/mês.

Até o segundo semestre deverá recolher fármacos das farmácias, hospitais e distribuidoras para devolvê-los à indústria farmacêutica. A meta para 2012 é entrar na cadeia de eletroeletrônicos. Maurício Gomes, diretor da Talog, destaca que a ampliação da operação em Pernambuco é estratégica. ´Escolhemos um local com facilidade de acesso ao Porto de Suape pela proximidade do polo naval e petroquímico`. Segundo ele, a unidade recém-inaugurada tem capacidade de movimentar entre 2 mil a 2,5 mil toneladas/mês.

Fred Silva, gerente regional da Talog, considera Pernambuco um mercado importante. ´Com o polo de Suape, podemos fazer a logística reversa a granel de líquidos e sólidos gerados pelos restos da produção`. Ele explica que o processo de reversa dos produtos químicos começa com a coleta na indústria, prossegue com o rastreamento da carga até a entrada na central de distribuição, segue para a análise das embalagens e finaliza com a devolução à indústria para reprocessamento.

Para Gomes, o país vem evoluindo no sistema de reciclagem de produtos e insumos, além de diminuir a exploração da natureza. (R.F.)


Latinhas têm uma cadeia espontânea
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Veja o processo de separação e classificação das latinhas de alumínio para reciclagem no Centro de Coleta da Latasa, em Recife. Imagens: Rosa Falcão/DP/D.A Press
As latinhas de alumínio são exemplo de logística reversa espontânea. A coleta é feita pelos catadores nas ruas e nos domicílios. Os sucateiros compram as latas e comercializam nos centros de coleta. O material é separado, reprocessado e enviado para o centro de fundição, onde é reciclado e se transforma em novas latinhas, que voltam ao mercado de consumo. O Brasil é campeão mundial em reciclagem de alumínio, com índice de 98,2% de reciclagem de latas. O Japão fica em segundo lugar, com 87,3% e os Estados Unidos estão na terceira colocação, com 54,2%.


Reciclagem de latas é remunerada em todas as suas etapas Foto: Teresa Maia/DP/D.A Press



O pontapé inicial da logística reversa de latinhas foi dado há vinte anos pela Aleris Latasa, maior empresa de reciclagem de alumínio do Brasil. Na época, foi implantada a coleta integrada de latas vazias através do projeto escola, que se transformou num dos incentivadores da reciclagem de latas no país. Segundo dados da operadora, atualmente mais de 192 mil latinhas são transformadas em alumínio líquido e voltam nas novas latas de bebidas. O processo gera uma economia de 95% em relação ao produção original do alumínio.

Hênio Nicola, diretor de operações da Latasa, diz que a cadeia de logística reversa da empresa já está pronta para atender às exigências da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). ´O nosso processo de reciclagem não depende de subsídio do governo. É uma cadeia remunerada pelo próprio negócio`. Ele explica que a reciclagem de latas é uma indústria com todos os elos da cadeia bem definidos e remunerados em todas as etapas, desde o catador, o sucateiro, o centro de coleta e a indústria.

No caso da Latasa, funcionam 12 centros de coleta no país, sendo um deles no Recife e dois centros de fundição de alumínio em Pindamonhangaba (SP). Além dos centros da Aleris Latasa, existem mais de 400 depósitos de sucatas e centros de coleta de latas de alumínio espalhados em todo o país. Como a coleta é feita pelos próprios catadores que trabalham com autônomos, a logística reversa é assegurada com a devolução do alumínio para a indústria.

O atrativo do negócio é o valor comercial do alumínio. O valor pago por quilo de latinhas de alumínio chega a R$ 3. Levando em conta o volume de 16 mil toneladas/mês recicladas no país, o negócio movimenta R$ 48 milhões/mês em todo o território nacional. Diferente dos outros tipos de insumos e produtos utilizados pela indústria, que dependem de uma estrutura de logística reversa montada para fazer a coleta e a devolução para descarte ou reciclagem.

No centro de coleta da Aleris/Latasa no Recife são prensadas 350 toneladas/mês de latinhas de alumínio. No período do carnaval, este volume cresce para 640 toneladas/mês. Moacir Barbosa Júnior, supervisor do centro, explica o processo: as latas chegam ao galpão, depois é feita a limpeza e a classificação do material e, em seguida, o alumínio é colocado na esteira para prensagem e depois segue para Pindamonhaga para ser reciclado. (R.F.)


Aparelhos são coletados
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Pesquisa divulgada pela Accenture, empresa especializada em consultoria de gestão, serviços de tecnologia e outsourcing, revela que o Brasil superou os países desenvolvidos na compra de eletrônicos pessoais, com destaque para os aparelhos de telefonia móvel. Em fevereiro, o número de celulares ativos no país superou a marca de 200 milhões. O brasileiro troca de celular e acessórios como quem troca de roupa. A pergunta é: para onde é levado o lixo eletrônico que fica na casa dos consumidores?

A TGestiona é a operadora de logística do Grupo Telefônica, que trabalha com a logística reversa de aparelhos celulares e acessórios. Em 2010, a empresa coletou e entregou 10 milhões de celulares. Estes aparelhos têm os componentes separados e seguem para a reciclagem. Levando em conta que o país gera o maior volume de lixo eletrônico per capita a cada ano, a coleta e reprocessamento deste material é imprescindível para proteger o meio ambiente.

Marcelo José de Souza, diretor de Logística da TGestiona, diz que a empresaé especializada em logística de resíduos eletroeletrônicos desde 2001. ´Vamos até a casa dos consumidores que não desejam mais os equipamentos e trazemos para as nossas instalações, onde fazemos a triagem e a destinação de cada tipo de material`.

Há dois anos, a empresa instalou um centro de distribuição em Jaboatão para fazer a coleta de produtos da Vivo em seis estados nordestinos. O material é coletado em 200 urnas da operadora distribuídas nos shoppings centers e ruas de grande circulação. Os celulares são desmontados e enviados mensalmente para o laboratório da TGestiona em São Paulo.

A Vivo tem um programa específico de reciclagem de celular. São 3,5 mil pontos de coleta de aparelhos, baterias e acessórios em todo o país. Cerca de 90% dos aparelhos coletados são reciclados e 10% são reaproveitados. Em 2010, foram coletadas 2 milhões de peças. (R.F.)


Saiba mais
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O que é logística reversa

É a devolução de mercadorias do cliente final ao distribuidor ou à indústria para serem reprocessadas e retornarem ao mercado de consumo

Como é aplicada a logística reversa?

São duas possibilidades: produtos novos que vieram com defeito e devem ser trocados ou devolvidos e mercadorias que já esgotaram a sua vida útil e precisam ser descartadas corretamente e de forma sustentável

Como são coletados estes produtos no mercado?

Existem empresas especializadas na área de transporte e logística que fazem a coleta, a armazenagem e a devolução dos produtos descartados ao fabricante

Quais os produtos passam pelo processo de logística reversa no Brasil?

Embalagens de agrotóxicos, pneus, pilhas e baterias, óleos lubrificantes, latinhas de alumínio, aparelhos e acessórios de celular

Qual o volume de produtos que passam pelo processo de logística reversa no país?

Apenas 10% de produtos que nunca foram usados ou que estão no final da vida útil retornam às empresas

Fontes - Aslog/MMA/CLRB

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